O médico Marcos Antônio Souza Júnior, que filmou um funcionário negro acorrentado pelos pés, mãos e pescoço, disse que o vídeo foi uma encenação criada pelos dois, na cidade de Goiás. Em uma rede social, ele disse que gravação foi uma ‘zoeira’. Mesmo assim, a Polícia Civil seguirá investigando o caso como racismo.
O homem filmado trabalha a cerca de três meses para o médico, segundo a Polícia Civil. A Secretaria de Igualdade Racial e Direitos Humanos da cidade de Goiás pediu ao Ministério Público (MP) que também investigue o caso.
Por meio de nota, o MP informou que recebeu o pedido e o encaminhou à Polícia Civil, que já está investigando o caso. Também de acordo com o comunicado, “a 3ª Promotoria de Justiça de Goiás está acompanhando a investigação”.
Em um vídeo divulgado nas redes sociais, o médico diz que tudo foi uma brincadeira e se desculpa com quem se sentiu ofendido.
“A gente fez um roteiro a quatro mãos, foi como se fosse um filme, uma zoeira. Não teve a intenção nenhuma de magoar, irritar ou apologia a nada. Gostaria de pedir desculpas se alguém se sentiu ofendido, foi uma encenação teatral”, disse.
No vídeo, o funcionário está acorrentado.
“Falei para estudar, mas não quer. Então vai ficar na minha senzala”, disse o médico na gravação.
O homem acorrentado disse à polícia que toda situação foi uma brincadeira e não registrou denúncia contra o médico. Mesmo assim, a investigação continuará. O delegado Gustavo Cabral foi à fazenda onde o vídeo foi gravado nesta quinta-feira (17).
“Apesar da vítima informar que partiu dela essa iniciativa e que não deseja representar contra esse médico por eventual constrangimento ou injúria, nós observamos a possibilidade de estar caracterizando o crime previsto no artigo 20, da lei de crimes raciais, por ele, aparentemente, ter incitado e induzido à prática de racismo”, explicou.
O conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil Eder Porfiro Muniz disse que a entidade ainda não foi provocada oficialmente a se manifestar ou acompanhar o caso.
“A OAB rechaça qualquer incitação ao racismo. O fato, por mais que eles falem que foi encenado, quando se referem a senzala, remete à escravidão e fere outras pessoas que lutaram para o fim da escravidão”, disse.
O conselheiro disse ainda que, mesmo sem uma denúncia por parte da vítima, a polícia pode investigar o caso devido à repercussão e ao crime.
Repúdio
A prefeitura da cidade divulgou uma nota dizendo que “o ato divulgado, sem explicação aceitável, causa profunda repulsa e deve ser objeto de investigação e apuração pela autoridade policial competente, para uma célere instrução e responsabilização nos termos da lei”.
Para o reitor da Universidade Zumbi dos Palmares e defensor dos direitos da população negra, José Vicente, o caso não pode ser encarado como uma “brincadeira”.
“Não pode se brincar, não é uma brincadeira devida nem apropriada e ela menos ainda serve como uma justificativa de retirar seja responsabilidade, seja culpabilidade, seja civil, penal ou criminal ou mesmo social em um fato concreto como esse”, disse.
O delegado que investiga o caso também repudiou a situação. “É terrível ver esse racismo estrutural ocorrendo. É terrível ver a própria vítima consentir na mente dela com essa situação, isso precisa ser mudado. Espero que esse caso, além da punição individual para essa pessoa, sirva de aprendizado para toda sociedade, para superar esse terrível racismo estrutural que a gente vive”, disse Gustavo Cabral.
Fonte: G1