Fonte G1 RN
Os depoimentos e provas apresentados à Polícia Civil pela modelo Najila Trindade, que acusou o jogador Neymar de estupro e agressão, apresentaram “incongruências”, conforme escreveu a delegada que investigou o caso no relatório final do inquérito. Neste domingo (4), o Fantástico teve acesso com exclusividade ao documento que esclarece os principais pontos que levaram a polícia a não indiciar o jogador de futebol pelos supostos crimes.
A investigação foi conduzida pela Delegacia de Defesa da Mulher, na Zona Sul da cidade de São Paulo. Na última semana, após dois meses de investigação, a delegada Juliana Lopes Bussacos anunciou que o caso estava encerrado. “Eu concluí a investigação e deliberei por não indiciar o investigado por ausência de elementos suficientes para tanto”, afirmou.
No relatório final, a delegada concluiu que “diante dos elementos colhidos no curso da investigação policial, não vislumbro elementos para o indiciamento do investigado, uma vez que as versões são conflitantes, com incongruências nas declarações da vítima e, principalmente, nas provas apresentadas pela mesma”.
Najila Trindade saiu carregada de delegacia em SP após prestar depoimento — Foto: Amanda Perobelli/Reuters
Quais são as contradições
Najila e Neymar relataram que o primeiro contato entre eles aconteceu por iniciativa dela, que mandou uma mensagem para o jogador em uma rede social, e que logo passaram a se comunicar por um aplicativo de mensagens. Os dois deram versões diferentes para o que aconteceu entre eles.
As contradições no caso que chamaram a atenção da polícia foram:
- Najila: diz que Neymar chegou por volta de 20 horas “aparentemente alterado” ao hotel Em Paris.
- Neymar: nega que estivesse embriagado e disse que tomou apenas uma dose de “gin” antes do encontro.
- Najila: conta que, conforme “rolavam na cama”, Neymar começou a lhe desferir “tapas” nas nádegas cada vez mais fortes, até que ela pediu para que ele parasse e ele respondeu: “desculpa, linda”.
- Neymar: relata que foi durante a relação sexual que Najila lhe pediu para que desferisse “tapas” nas nádegas. Ele disse que ela não só não pediu para que ele parasse, como pedia mais.
- Najila: disse à polícia que Neymar puxou-a fortemente pelo braço, virando-a de costas. Puxou seus cabelos e a penetrou. Ela afirmou que a todo momento pedia para que ele parasse.
- Neymar: nega ter sido violento com ela e disse que jamais puxou os cabelos dela ou usou violência.
- Najila: conta que Neymar a fotografou sem pedir autorização. Ela afirma que ele a empurrou e tirou uma foto de seu corpo nu. Afirma que Neymar deixou o quarto de hotel e, que após alguns minutos, lhe enviou a foto que havia tirado sem sua autorização.
- Neymar: diz que ao perceber as marcas rosadas nas nádegas de Najila pediu para tirar uma foto. O jogador afirma que a modelo fez uma pose para ele e que ambos dão risada da situação. Em seguida, ele diz que vai enviar a foto para ela.
- Logo depois de receber a foto, Najila e Neymar trocam mensagens pelo celular. Em um documento que faz parte do inquérito, os advogados do jogador consideram a conversa uma prova cabal de que não houve estupro.
- Najila escreve: ‘Vai ter volta’
- Neymar responde: ‘Vai nada hahahah’
- Najila: ‘Vai arrregar?’; ‘Faltam 3 ainda p vc conhecer’; ‘Essa foi tranquila’
- Neymar: ‘Ah não’; ‘Claro que vamos transar de novo’.
No dia seguinte, Neymar volta ao hotel em Paris e mais uma vez as versões são conflitantes:
- Najila: diz que insistiu para que o jogador voltasse ao hotel porque queria “bater nele”, pois estava com muita raiva do que ele havia feito com ela, “precisando dar vazão ao que estava sentindo”. Afirma que decidiu fazer o vídeo do encontro porque estaca com medo do que poderia lhe acontecer quando ele retornasse ao quarto do hotel.
- Neymar: afirma que não percebeu que estava sendo gravado, que a modelo estava “fora de controle”, “histérica” e que pediu para ela se acalmar. Segundo o jogador, Najila disse que se sentiu usada, e ele então teria explicado que “não era nada disso”.
- Najila: diz que a gravação completa de 6 minutos do que aconteceu no último encontro estava em um tablet que foi levado de seu apartamento.
Vídeo do encontro
A única pessoa, segundo a investigação, que confirma ter visto o vídeo na íntegra é Estivens Alves, ex-marido de Najila. Segundo ele, Neymar aparentava estar surpreso e assustado. O jogador teria tentado acalmar a modelo sem qualquer tipo de agressividade.
Estivens reproduziu para a polícia o que Najila teria dito no vídeo: “Me desculpa, eu estraguei tudo, me perdoa. Eu te machuquei?”.
Corpo de delito
No relatório final da investigação, a médica legisla Iris Adriani Ribeiro Caserta, responsável pelo exame de corpo de delito, disse que analisou todo o corpo de Najila e não encontrou sinais de lesão. Ela afirmou ainda que a modelo não disse ter sofrido agressões durante o ato sexual. O exame foi feito 16 dias após o encontro com Neymar.
O relatório da polícia também menciona o exame de corpo de delito indireto, feito pelo IML a partir das fotos e do laudo particular de Najila. Os legistas não descartam a possibilidade de autolesão. Eles afirmaram também ser impossível relacionar as marcar aos tapas que a modelo diz ter levado em Paris por causa da baixa qualidade das fotos apresentadas.
O que dizem as defesas
O advogado de Najila, Cosme Araújo, considera precipitado a decisão da polícia de encerrar o inquérito sem indiciar Neymar. Ele pediu uma acareação entre os dois, mas a delegada considerou desnecessário. “O inquérito é inconclusivo. O Ministério Público pode indiciar o jogador e pedir novas diligências e o processo pode caminhar normalmente”, afirmou.
A defesa de Neymar não quis se manifestar sobre a decisão da polícia.
Dois inquéritos
A Polícia Civil possui ainda duas investigações relacionadas ao caso.
Uma delas foi aberto voluntariamente pelos delegados após Najila noticiar que sumiu de sua casa um tablet que conteria o inteiro teor de um vídeo que mostraria Neymar lhe agredindo. Este inquérito investiga também “todos os outros equipamentos que foram subtraídos no curso do inquérito”, disse a delegada responsável pelo caso, Monique Ferreira Lima, do 11º Distrito Policial da capital.
Este inquérito, segundo o diretor do Decap, reunirá todos os elementos em relação à denúncia de estupro feita por Najila no inquérito que acaba de ser concluído.
Outro inquérito foi aberto por iniciativa de Neymar e do pai dele, que peticionaram à investigação afirmando que houve denunciação caluniosa e extorsão por parte de Najila. Nestes dois inquéritos em andamento será apurado se outros crimes foram cometidos ao longo do caso.
Neymar deixa delegacia da mulher após prestar depoimento — Foto: GloboNews/Reprodução
Cronologia do caso
Início de maio
- Najila mantém contato via rede social com Neymar e ambos passam a se corresponder
- Eles acertam a ida de Najila a Paris, com passagem paga pelo jogador
15 de maio
- Neymar e Najila se encontram num hotel em Paris, onde ela estava hospedada;
- Neste dia, segundo a modelo, ela foi vítima de agressão e de estupro
16 de maio
- Os dois voltam a se falar por um aplicativo de mensagens. Ela diz que quer ver o jogador de novo. Neymar diz: “Claro que eu quero transar com você de novo”.
- O jogador vai de novo ao hotel em que Najila está. Um vídeo mostra a modelo agredindo o jogador a tapas no quarto. O vídeo é interrompido sem mostrar o desfecho da cena;
- Neymar deixa o hotel. Mais tarde, os dois trocam mensagens por uma rede social: a modelo envia uma foto com marcas no corpo dela. Neymar responde dizendo que ela havia sido culpada pelas marcas. “Tá doido?”, questionou a modelo, afirmando que pediu para o jogador e que Neymar chegou a pedir desculpas a ela.
21 de maio
- Já de volta ao Brasil, Najila se submete a um exame com o médico Luiz Eduardo Rossi Campedelli. O laudo aponta hematomas, arranhões nos glúteos, transtorno ansioso e depressivo e traumatismos superficiais não especificados.
31 de maio
- A modelo registra ocorrência de estupro em uma delegacia de São Paulo.
1º de junho
- O caso vem a público. O pai do jogador diz que o atleta é vítima de uma tentativa de extorsão; o advogado que representava Najila na ocasião nega.
2 de junho
- Neymar grava um vídeo em que diz que a relação dos dois foi consentida. “Foi uma relação entre homem e mulher, dentro de quatro paredes, algo que acontece com todo casal (…) Agora fui pego de surpresa por causa disso.”
3 de junho
- Escritório de advocacia contratado por Najila rescindiu o contrato com a cliente, alegando que ela havia relatado para os advogados que havia sofrido uma agressão, mas não mencionou estupro.
5 de junho
- Em entrevista, a modelo disse que se recusou a manter relação sexual com o jogador porque não havia preservativo; segundo ela, ele a virou e bateu violentamente nas nádegas dela;
6 de junho
- Neymar depõe em uma delegacia do Rio. Na saída, agradece pelo apoio. “Me senti muito amado.”
7 de junho
- Najila presta depoimento em delegacia de São Paulo e diz que vídeo com Neymar estava em tablet que foi furtado.
10 de junho
- Segundo advogado de Najila abandona o caso.
12 de junho
- Estivens Alves, ex-marido de Najila Trindade Mendes de Souza, presta depoimento na 6ª DDM. Segundo o advogado dele, Estivens vai falar sobre a visita que fez ao apartamento de Najila para retirar o tablet e o notebook do filho do casal.
13 de junho
- Neymar depõe em delegacia de São Paulo.
18 de junho
- Najila depõe novamente sobre caso Neymar após Justiça determinar que ela entregasse o celular, porém, advogado da modelo diz que celular de Najila sumiu depois que ela deu o 1º depoimento sobre caso Neymar.
19 de junho
- Najila entrega novo celular para a polícia após sumiço do aparelho que usou para falar com Neymar, segundo o advogado dela.
28 de junho
- Amiga da modelo, Yasmin Abdalla presta depoimento para esclarecer como se deu o sumiço do celular de Najila que teria sido usado para gravar o segundo encontro com Neymar em Paris.
1º de julho
- Polícia pede mais prazo para investigar o caso.
11 de julho
- MP concorda com pedido da polícia por mais prazo para investigar.
12 de julho
- Justiça dá mais prazo para a polícia concluir o inquérito.
29 de julho
- Delegada conclui inquérito sem indiciar Neymar.