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PM que relatou pedido de propina diz que Luis Miranda negociou compra de vacina; deputado contesta

Luiz Paulo Dominghetti Pereira. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

O policial militar Luiz Paulo Dominghetti Pereira afirmou à CPI da Covid que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) tentou negociar a compra de vacinas contra a covid-19 com a empresa Davati Medical Supply. A negociação é investigada pela comissão após Dominghetti ter dito, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, que recebeu um pedido de propina do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, exonerado ontem do cargo. Presente na sessão após ser citado, Miranda contestou a versão.

“O Christiano (Alberto Carvalho, representante da Davati) me relatava que volta e meia tinha parlamentares, não sei quem, o procurando, e quem mais o incomodava era o deputado Luís Miranda, o mais insistente com a compra, negociação de vacinas”, disse o policial.

Para comprovar a negociação, Dominghetti apresentou à CPI um áudio em que Miranda afirma ter um “potencial comprador e com potencial de pagamento instantâneo”. Em um dos trechos, na versão do policial, o deputado diz que as negociações anteriores frustradas haviam desgastado “seu irmão”, o que seria uma referência a Luis Ricardo Fernandes Miranda, chefe do setor de importação do Ministério da Saúde que denunciou suspeitas de irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin.

No áudio, porém, a expressão “meu irmão” utilizada por Miranda soa como uma gíria que o deputado repete várias vezes ao longo da conversa. Na mensagem também não há menção a qual produto estava sendo negociado, nem para quem (ouça e leia a transcrição abaixo).

“Eu não vou mais perder tempo com esse comprador, porque desgastou muito, meu irmão, nos últimos 60 dias. É muita conversa fiada no mercado e aí eu nem me sinto confortável”, diz o deputado na mensagem.

A gravação, de acordo com Dominguetti, não foi enviada a ele, mas ao representante oficial da Davati no Brasil, Christiano Alberto Carvalho. O policial disse que recebeu o áudio após o depoimento de Luis Miranda na CPI, na semana passada.

O áudio provocou controvérsia na CPI. Os senadores suspeitaram da tentativa de colocar Miranda, que denunciou irregularidades no processo de aquisição de vacinas no Ministério da Saúde, agora ser apontado como alguém que também teria intermediado negociações. “Não venha achar que aqui todo mundo é otário, nem pateta. Veja bem qual é seu papel aqui. Do nada surge um áudio do deputado Luis Miranda. Chapéu de otário é marreta, irmão”, afirmou o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-BA).

Também chamou a atenção dos parlamentares da CPI o fato de senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) sair em defesa do policial que denunciou corrupção no governo. Em resposta a Omar, Flávio disse que “o áudio é importante”. Ao que o presidente da comissão reiterou que Miranda foi convocado para falar de novo à CPI e disse: “Se o deputado Luís Miranda está envolvido com maracutaia, pegou pernada, isso é problema dele, não é nosso”.

Após ser citado, Miranda foi até a sala onde a CPI ouve Dominghetti e teve que ser contido por colegas e pela Polícia Legislativa do Senado. Em entrevista a jornalistas logo em seguida, disse que o policial mentiu. Segundo o deputado, a mensagem tratava de aquisição de luvas e não de vacinas e foi enviada em outubro de 2020. “Trata de fornecimento de luvas entre uma empresa privada e a minha empresa privada”, disse Miranda. “A intenção é clara desde o princípio é descredibilizar as testemunhas que de fato trouxeram evidência que existe corrupção dentro do Ministério da Saúde”, completou.

Ele foi levado para uma sala reservada conversar com alguns membros da CPI. O vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), determinou a retenção do celular de Dominghetti para perícia pela Polícia do Senado, após um pedido do senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da investigação.

Como revelou ontem o Estadão, a Davati, empresa que Dominghetti afirmou representar, chegou ao governo por meio de um oficial da reserva do Exército que integra a chamada “Abin paralela”, grupo de informantes que Bolsonaro afirma manter para não depender dos órgãos oficiais de informação. O coronel Roberto Criscuoli disse ao Estadão ter sido responsável por fazer a ponte entre a Davati Medical Supply. A empresa nega que o policial seja seu representante.

Em e-mail à reportagem, porém, o responsável pela Davati nos Estados Unidos, Herman Cárdenas, admitiu que o nome de Dominghetti foi incluído em comunicações com o governo brasileiro sobre oferta de vacinas da AstraZeneca apresentada pela companhia. O nome de Dominghetti foi incluído “a pedido”, de acordo com Cárdenas, sem explicar quem teria feito a solicitação.

“Incluímos o nome do Sr. Dominghetti no FCO (oferta) que apresentamos ao governo brasileiro porque nos pediram e presumimos que ele fosse representante deles”, afirmou Cárdenas, por e-mail.

“A história tem focinho de estelionato, rabo de estelionato, pé de estelionato. Será que é estelionato? Vamos descobrir, mas chama atenção a repetição do procedimento do governo cheio de amadorismo, privilégio às relações de amizade e aos velhos esquemas. Manter o foco é essencial”, afirmou Alessandro Vieira (Cidadania-SE), suplente na CPI.

Fonte: Estadão

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