
Um terço (171) dos 513 parlamentares da Câmara dos Deputados declarou apoio à anistia aos acusados e condenados pelo 8 de Janeiro, principal pauta do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores no Congresso, segundo o Placar da Anistia do Estadão – levantamento exclusivo para identificar como cada um dos deputados se posiciona sobre o tema.
O levantamento constatou, porém, que é menor o apoio à ampliação da anistia para Bolsonaro: 105 deputados manifestaram posição favorável ao perdão para o ex-presidente e mais 33 pessoas denunciadas pela Procuradoria-Geral da República por tentativa de golpe de Estado, enquanto 159 rejeitam a ideia. Um grupo de 43 deputados declarou ser a favor da anistia, ao mesmo tempo em que rejeita sua extensão ao ex-presidente e outros denunciado.
Esse número de apoiadores declarados é suficiente para garantir a apresentação da urgência do projeto de lei no plenário da Casa – ideia proposta pelo PL – e está a 86 votos de atingir a maioria absoluta na Câmara. Para um projeto de lei ser votado na Casa, é preciso haver o mínimo de 257 deputados na sessão. O texto é aprovado com votos da maioria simples, ou seja, maioria dos presentes.
Na polarização acirrada entre os parlamentares favoráveis e os contrários à anistia, existe um grupo de 43 deputados que impõem um limite aos beneficiados pela medida. Esses parlamentares, em resposta à terceira pergunta da enquete, disseram ser a favor da extinção ou redução das penas dos envolvidos nos atos golpistas. Porém, ao mesmo tempo, se posicionaram contra a ampliação do alcance do perdão para Bolsonaro e os outros 33 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por tentativa de golpe de Estado ( mais informações na página A12).
O Estadão contatou todos os 513 deputados presencialmente, por telefone, via assessoria de imprensa e por e-mails enviados aos gabinetes. Até as 17h de ontem, três em cada quatro parlamentares (75%) tinham respondido ao questionário. Outros 135 não haviam retornado. O levantamento será atualizado diariamente no portal do Estadão caso os deputados que não responderam se manifestem ou se houver mudança de posição.
Perguntas
Do total de entrevistados, 378 responderam a três perguntas feitas pelo Estadão. Na principal questão, se eram a favor ou contra a anistia, os deputados podiam escolher as opções “sim”, “não” ou “não quero responder”.
O tema ganhou tração no Congresso no ano passado, quando Bolsonaro passou a defender uma anistia aos presos do 8 de Janeiro. Um desses projetos começou a tramitar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, então presidida pela bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC). Caso fosse aprovado no colegiado, o mais importante da Casa, o texto iria a plenário para votação, restando apenas o Senado.
O Estadão mostrou que juristas viam o texto apresentado na CCJ como “muito amplo” e com brechas que poderiam favorecer o ex-presidente. Uma movimentação feita pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), frustrou os planos dos bolsonaristas. Ele abriu, em 2024, uma comissão especial para discutir a anistia, em tese dificultando ainda mais o caminho para a proposta avançar. Até hoje a comissão não iniciou os trabalhos.
Dados do levantamento feito pelo Estadão mostram que quem é contra a anistia é irredutível na punição aos acusados de atos golpistas, à exceção de poucos deputados, que entendem que quem cometeu infrações menores poderia receber penas mais proporcionais.
Vandalismo
O entendimento dos parlamentares pró-anistia varia. A ala mais radical defende, em sua maioria, um perdão total para todos os envolvidos nos ataques às sedes dos três Poderes e que o indulto se estenda a Bolsonaro. Quem não defende um perdão completo a todos os envolvidos no 8 de Janeiro argumenta que o que aconteceu naquele dia não foi “tentativa de golpe de Estado”, mas “ato de vandalismo”.
Para sustentar o argumento, citam, por exemplo, o voto do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pela condenação a 14 anos de prisão da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou a frase “Perdeu, mané” na estátua da Justiça, em frente ao prédio da Corte. Débora está presa na Penitenciária Feminina de Rio Claro (SP) desde a oitava fase da Operação Lesa Pátria, deflagrada pela Polícia Federal em março de 2023.
“Esse negócio está muito nebuloso”, disse o deputado João Leão (PP-BA), que preferiu não se posicionar no placar, mas vê excessos do STF e afirma que, se Bolsonaro for condenado, defenderia uma anistia para ele. “Se tiver comprovação real de que foi o cara que quebrou vidro, acho que esse cara tem que sofrer uma pena. Mas a mulher que escreveu com batom na estátua tomar 14 anos de prisão, aí não.”
A maior parcela entre os deputados que responderam à enquete diz ser favorável à anistia. Até as 17h de ontem, 171 deputados responderam “sim”, 115 disseram “não” e outros 92 não quiseram responder.
Enquanto líderes do PL, de Bolsonaro, e do PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, são incisivos em seus posicionamentos, representantes do Centrão preferem não se posicionar abertamente, por considerar a pauta desagregadora e de difícil diálogo. “É um tema que não converge, então tem que dialogar bastante”, afirmou Pedro Lucas Fernandes (MA), líder do União Brasil.
Depois do PL, o União Brasil é o partido com mais deputados que apoiam abertamente a anistia – 22 deles defendem o perdão a quem esteve na Praça dos Três Poderes durante os ataques aos prédios do Congresso, do STF e do Palácio do Planalto. A bancada tem 59 parlamentares. O partido possui três ministérios no governo Lula, mas também abriga parlamentares bolsonaristas. Alguns deles apoiam anistia para Bolsonaro. “Se aparecer a anistia para Bolsonaro, eu defendo”, disse Alfredo Gaspar (AL).
Sete deputados do PL preferiram não se posicionar: Antonio Carlos Rodrigues (SP), Detinha (MA), Emidinho Madeira (MG), Junior Lourenço (MA), Marcio Alvino (SP), Pastor Eurico (PE) e Soraya Santos (RJ). Entre os petistas, três fizeram o mesmo: Alexandre Lindenmeyer (RS), Carol Dartora (PR) e Flávio Nogueira (PI). A convicção majoritária entre os petistas é de que quem participou dos atos golpistas precisa pagar. “Não foi ato espontâneo, mas tentativa articulada de golpe. Quem financiou, mobilizou e arquitetou essa tentativa deve ser responsabilizado”, disse Carlos Veras (PT-PE), primeiro-secretário da Câmara. “A anistia seria um incentivo à impunidade e um convite para novos ataques à democracia. Cada envolvido deve responder por seus atos, conforme a lei.”
Entre os defensores da anistia, a maior parte quer que o benefício atinja a todos os envolvidos nos atos golpistas, segundo o levantamento do Estadão. A pesquisa aponta que 104 deles querem uma anistia total, 45 deles, a redução da pena, enquanto 117 não querem nenhuma medida – fazem parte desse grupo os contrários à anistia. Mais de uma centena (112) de parlamentares não quis responder a essa pergunta.
O Placar da Anistia do Estadão mostra que, entre os parlamentares a favor da anistia aos presos de 8 de Janeiro, existe um grupo de 43 deputados que se posicionam contra a ampliação do alcance da medida para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e as outras 33 pessoas denunciadas pela ProcuradoriaGeral da República (PGR) por tentativa de golpe de Estado.
Em resposta a uma das perguntas do levantamento exclusivo do Estadão, 105 deputados declararam ser a favor do perdão para o ex-presidente e os outros denunciados, enquanto 159 rejeitam a ideia. O projeto de lei articulado na Câmara dos Deputados que propõe perdoar os crimes referentes ao 8 de Janeiro tem brechas para beneficiar diretamente o ex-presidente ( mais informações na pág. A14).
Apesar de compartilharem a mesma posição, os deputados que integram esse grupo têm razões diferentes para defender o perdão aos extremistas que depredaram as sedes dos três Poderes sem estender a medida a Bolsonaro.
“Sou a favor da legalidade. Quem tramou pelo assassinato de autoridades, desvio de finalidade do dinheiro público e dos Poderes constituídos, por exemplo, deve, sim, ser punido pesadamente, sempre com direito amplo de defesa, conforme preconiza a lei. Apesar disso, muitos presos do 8 de Janeiro, pessoas comuns da sociedade civil, tiveram penas desproporcionais em relação às penas de assassinos confessos”, argumentou o deputado Amom Mandel (Cidadania-AM).
Crimes
Há ainda parlamentares que se dizem contra a anistia para Bolsonaro e seus aliados porque eles não teriam cometido crimes. Outros deputados argumentam que o ex-presidente não deve ser beneficiado pelo projeto de lei porque não chegou a ser preso. “Anistia é para quem está preso, quem co
Amom Mandel (Cidadania-AM) Deputado meteu vandalismo que pague por vandalismo”, afirmou o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG).
Bolsonaro e os outros acusados foram denunciados pela PGR por crimes como a tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de Estado e organização criminosa armada.
O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar na terçafeira o “núcleo 1”, do qual fazem parte o ex-presidente e outros sete denunciados. Os ministros da Primeira Turma da Corte vão decidir se acolhem a denúncia da PGR e abrem ação penal. Caso isso aconteça, os acusados se tornarão réus.
O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que é um fiel aliado do ex-presidente, disse que se posiciona neste momento contra a extensão da anistia para os denunciados pela PGR por considerar que a prioridade é livrar da cadeia as mais de 70 pessoas que já cumprem suas penas em regime fechado.
“O próprio Bolsonaro disse que estava focado agora nas pessoas do dia 8. Não que eu seja contra ou a favor, óbvio que se fosse pautado para poder, acredito que para ampliar para ele, seria favorável. Mas vejo que o foco do presidente é anistiar o pessoal do 8 de Janeiro”, afirmou Nikolas ao Estadão.
Fonte: Estadão