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Mãe leva filha com paralisia cerebral à faculdade há 5 anos, assiste às aulas e copia as lições

Fonte: G1

Gilda Mendonça não conseguiu concluir o ensino fundamental mas vive uma verdadeira rotina de estudante universitária porque quer ver a filha, que tem Paralisia Cerebral (PC), se tornar uma psicóloga.

É pelas mãos dela que o aprendizado de Suellen Carvalho, de 30 anos, também acontece. Ela leva a filha cadeirante todo dia, há cinco anos, até a faculdade e, com atenção, passa para o caderno o que é ensinado na sala de aula.

Como a jovem mora na cidade de Iguaba Grande e estuda em Cabo Frio, na Região dos Lagos do Rio, e também não consegue escrever, é assim, lado a lado, dentro e fora da universidade, que mãe e filha estão fazendo do sonho uma realidade cada vez mais próxima. E o combustível que move as mãos e o coração dessa mãe pelas estradas da vida, é o amor.

“Minha mãe significa tudo pra mim. Ela é uma mãe guerreira, uma heroína, uma supermãe. O que ela faz é de um carinho, de um amor. É o que eu sinto por ela. Muito amor”, disse abrindo o coração.

Gilda ajeita o cabelo de Suellen durante entrevista concedida a projeto universitário em Cabo Frio, no RJ — Foto: Schrilley Maia / Reprodução Expresso UVA

Gilda ajeita o cabelo de Suellen durante entrevista concedida a projeto universitário em Cabo Frio, no RJ — Foto: Schrilley Maia / Reprodução Expresso UVA

A estudante está no 8º período, mas a formatura só deve ocorrer entre 2021 e 2022, mais por uma questão do ritmo de aprendizagem que cada aluno tem.

“Ela me ajuda, ela copia a matéria pra mim. Em casa, a gente estuda, a gente lê. Eu ensino ela e ela me ensina a viver a vida da melhor forma possível. Nós aprendemos juntas”, contou Suellen ao G1.

A coordenadora do curso de Psicologia, Sueli Ávila, explica que Suellen não apresenta déficit intelectual que comprometa o processo, mas o fato da jovem falar com dificuldade acaba se tornando um desafio, principalmente, na hora das provas, que precisam ser orais.

“Ela tem um rendimento bom. O problema maior dela é com a fala. Então, às vezes, para ela fazer uma prova com uma questão discursiva, a gente tem uma certa dificuldade de entender o que ela fala”, explica a coordenadora do curso.

Quanto à ida da mãe de Suellen todos os dias à universidade, a coordenadora se impressiona com a força de vontade e amor envolvidos e explica a importância disso para a aluna.

“Essa mulher se abdica da vida dela. Cuida dessa menina o tempo todo. É claro que a presença da mãe auxilia muito ela, não resta a menor dúvida disso”, explicou a coordenadora do curso.

Preferiu estudo presencial

Conseguir transporte para a faculdade foi uma batalha para Suellen. Ela disse ao G1 que teve que recorrer à Defensoria Pública para ter direito a usar um carro da Prefeitura de Iguaba Grande.

“A Prefeitura me ofereceu um tablet para eu estudar pelo computador. Mas eu não queria estudar à distância. Pela Defensoria Pública, me autorizaram a usar o carro da Prefeitura duas vezes por semana e o ônibus da Educação em outro dia”, disse.

A jovem iniciou sua vida acadêmica cursando Administração, mas seu foco mudou com o objetivo de ajudar as pessoas.

“Eu comecei fazendo Administração, mas escolhi Psicologia por causa da área jurídica. Meu objetivo era fazer Direito para ajudar as pessoas, mas era muito difícil, agora quero trabalhar na área jurídica de psicologia”, explica.

Os pais de Suellen são separados e Gilda cuida dela e de seus dois irmãos: Gabriel, de 22 anos, e Daniel, de 19.

“Ela é muito batalhadora. Minha mãe é sozinha para tudo. Eu recebo uma ajuda de um salário mínimo do governo e um pouco do meu pai, mas minha mãe é quem cuida da gente”, contou.

Suellen disse que os irmãos, que estão no 2º ano do Ensino Médio, têm dificuldades de aprendizado. Mas ajuda e exemplo são o que não faltam em casa.

“Eles têm um pouco de dificuldade na escola. Eles pedem ajuda para mim e eu ajudo. Minha mãe acompanha e nós estudamos juntos”, disse.

Suellen, moradora de Iguaba Grande (RJ), conta que seus irmãos, Daniel e Gabriel, têm dificuldades na escola mas ela e mãe se unem para ajudá-los — Foto: Suellen Carvalho / Arquivo Pessoal

Suellen, moradora de Iguaba Grande (RJ), conta que seus irmãos, Daniel e Gabriel, têm dificuldades na escola mas ela e mãe se unem para ajudá-los — Foto: Suellen Carvalho / Arquivo Pessoal

E mais sonhos…

Para ajudar a se locomover – e, assim, também ajudar sua mãe – Suellen contou que está fazendo uma campanha nas redes sociais para conseguir comprar uma cadeira de rodas motorizada. A estudante relatou que está sendo difícil conseguir os recursos, mas que não deixa a peteca cair.

“Eu tenho uma campanha para conseguir uma cadeira motorizada para facilitar a minha vida que vai ajudar minha mãe também. Eu mesmo tive a ideia de fazer isso. Tá um pouco difícil, mas eu vou conseguir aos poucos”, comentou.

Suellen também gosta de ouvir músicas e disse que tem ainda um outro grande sonho, o de conhecer o cantor Luan Santana.

“Eu sou muito fã do Luan Santana. Gosto muito dele e minha maior vontade é conhecê-lo um dia. Amo demais a música e o trabalho dele”, disse.

A história de Suellen e Gilda foi tema de um trabalho especial para o Dia das Mães feito pelos alunos do curso de jornalismo da Universidade Veiga de Almeida (UVA), onde Suellen estuda psicologia. Confira abaixo a entrevista feita pela estudante Juliana Gandard.

Paralisia cerebral

Suellen é uma das 17 milhões de pessoas no mundo que, segundo a Associação Brasileira de Paralisia Cerebral (ABPC), vivem com a paralisia.

A paralisia cerebral é um termo usado para se referir a uma doença cerebral não progressiva, que pode se originar durante o período pré-natal, neonatal e pós-parto imediato, quando as conexões neuronais ainda estão em formação.

Estudos apontam que a paralisia é a deficiência física mais comum na infância. O site da ABPC explica que, no Brasil, “há uma carência de estudos que tenham investigado especificamente a prevalência e incidência da paralisia cerebral (PC)”.

Estudos acadêmicos apontam que a estimativa é que a incidência de PC nos países em desenvolvimento seja de 7 por 1.000 nascidos vivos.

*Estagiário sob a supervisão de Ariane Marques.

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